9 de novembro de 2015

Minha transição capilar - A história e fotos

   Cabelo é um assunto muito importante para pessoas afro-descendentes. É um símbolo de identidade. O objetivo dessa postagem é incentivar pessoas que estão na transição capilar ou querem iniciar o processo, mas ainda estão criando coragem. No Youtube e na blogosfera têm muitas pessoas registrando suas transições e ajudando e confortando outras com seus registros. Foram delas que tirei forças quando meu cabelo foi entrando em determinadas fases, sei o quanto é importante. Agora estou fazendo o mesmo, quanto mais histórias conhecemos nessa fase, mais determinadas ficamos.   

      Vou iniciar a história em dezembro de 2010. Cacheado. Sempre usei o cabelo assim. Era feliz com meu cabelo e não era adepta de fazer escova em momento algum. Fazia relaxamento com o objetivo de definir (aqui tem várias histórias para contar) os cachos e só.
      
      Antes da época dessa foto, eu dei aulas em um local onde a coordenadora sempre fazia alguns comentários abusivos, dizia que eu não tinha cara de professora, fazia comentários de péssimo gosto sobre o cabelo estar lavado ou não. Cabelos cacheados crespos estão sempre sendo lavados e umidificados para facilitar a finalização dos penteados, então não compreendia bem a intenção do comentário. Ela dizia que eu não tinha uma cara como as outras professoras da escola, as que eram negras eram escovadas e uma delas usava implante. Ela estava sempre colocando dúvidas sobre minha capacidade de ensino e, quando estava engraçadinha, tinha um comentário sobre meu cabelo. Já tinha dado aulas em outras escolas e isso não havia acontecido. Eu não sabia que isso era racismo (ou injúria), já que em momento algum ela se referia a minha etnia ou cor da pele. Hoje sei que era, caso aconteça em outra situação, minha providência será:"polícia já"!  Fui trabalhar em outro local após o fim do ano letivo e, vida que segue, nunca mais passei por isso. 
     
       Fui fazer relaxamento novamente e o cabelo ficou bem ressecado, normal o relaxamento sempre fazia isso. Fui a um salão perto da minha casa fazer algum tratamento para o ressecamento, o salão que fazia relaxamento era em outro bairro. A indicação foi um tratamento usando prancha e queratina, saí de lá com ele "pranchado", a cabeleireira garantiu que após a primeira lavagem ele voltaria a ficar como na foto acima. Lavei e ele ficou terrível. As mechas eram metade lisas e metade enroladas, pontas lisas e raízes crespas, raízes lisas e pontas enroladas, uma loucura. Voltei lá, ela disse que tudo voltaria ao normal e que eu continuasse lavando bastante. Ele não voltou, fiquei com raiva, não acreditava mais nela, nunca mais voltei lá. Segui fazendo escova simples para esconder essa bagunça. Vi que nada que eu fizesse faria ele voltar, só o corte. Até que outra cabeleireira me sugeriu a progressiva. Vi como uma solução e gostei. Era melhor do que cortar.

      A foto abaixo foi em abril de 2011. É a primeira foto com ele completamente alisado, já tinha tomado a decisão que seria alisada e pronto, eu podia molhar e nada de enrolar. Hoje sei que nada faria ele enrolar, pois muitas vezes alisei o cabelo somente com esse processo: queratina, prancha e mais nada, na fase alisada.


      As pessoas adoravam esse cabelo, sempre tinham elogios. No trabalho ouvi a frase: "Hoje que está arrumada, fica na frente na hora da apresentação". Como assim hoje está arrumada? Com o cabelo cacheado não estava arrumada e sim descabelada? Essa frase me fez entender o que as pessoas pensam sobre cabelo cacheado crespo. E mesmo assim não tomei nenhuma providência, achei que era importante para meu lado profissional. 

      Quanta besteira. Aqui já seria mais um motivo pra desistir dessa ideia, processar quem errou no meu cabelo e cortar, entender o que aconteceu como um dano a minha estética. Essa é a diferença entre uma pessoa com a identidade formada, com conhecimentos plenos de sua etnia e uma que acha que tem tudo isso e na verdade não tem. Por isso comecei a escrever sobre isso aqui no blog, tudo o que eu aprender sobre a história afro servirá para conscientização e formação de identidade de quem tiver a oportunidade de ler. Os professores são parte importante, pois a falta de conhecimento sobre a história e etnia do outro leva a pensamentos como "estar arrumada com cabelos alisados".  
      
     Desde que iniciei a progressiva, não fiz mais relaxamento. Assim que a parte onde só tinha produto da escova cresceu, cortei o cabelo. Foto abaixo tirada em julho de 2013.

      O tempo foi passando e eu comecei a me sentir presa a escova, pois tinha que fazer mensalmente, meu cabelo é muito enrolado, logo aparecia a diferença. Gastava muito dinheiro com isso. O cabelo foi ficando desbotado, extremamente oleoso, com as pontas feias. Comecei a pensar em voltar a usá- lo natural, porém não tinha coragem de cortar. Assisti vídeos onde as moças falavam do corte, achei que nunca faria. Vinha meu casamento em 2014, como casaria com ele cortado, eu pensava. 

      Casei (fotos aqui) e tive queda de cabelo logo em seguida, devido ao estresse da organização do casamento (descobri que isso acontece com muitas mulheres). Depois eles voltaram ao normal e eu continuei a me sentir comandada pelo cabelo e jogando dinheiro no lixo. Comecei a pensar na transição novamente. Essa foto é uma das últimas de 2014, com ele 100% escovado:

      Decisão tomada. Modo transição ON. A foto abaixo foi em dezembro de 2014. Estava me sentindo insegura, o cabelo foi ficando esquisito.
                                                                                                                                                                
      O engraçado é que os olhares estranhos logo aparecem. Você passa por uma mulher descuidada. As pessoas fazem comentários associando a falta de dinheiro, indicam um salão com escova progressiva baratinha sem você pedir informação, criam fatos como: "com a correria nem fez escova né!". Tudo isso sem perguntar nada a você. Imaginam e respondem ou te fazem perguntas e elas mesmo respondem kkkkk. Minha resposta, quando realmente tinha a chance de conseguir responder, era a mesma: "Estou deixando ele voltar ao natural". Via olhares de desconfiança ou frases como: "Duvido que consiga!" , "Será que volta?" ou "Salão X está com a escova na promoção". Já estava blindada, nem ligava. A foto abaixo foi em abril de 2015.
                                               
      Aqui foi meu primeiro corte, as pontas foram arrebentando, senti necessidade de cortar. Com a parte crescida, muitas pessoas começaram a compreender o que estava acontecendo. Tiveram a certeza do que eu estava fazendo a partir dessa foto. Tive muita força das pessoas ao postá-la no meu Facebook. Mas na vida real ouvi a frase: "Que bom que está tirando a progressiva, mas você vai fazer relaxamento pra ficar arrumada né?". A foto foi tirada em julho de 2015, porém só postada em agosto.


     As fotos abaixo foram tiradas em outubro de 2015. Com as pontas arrebentadas fiz mais um corte.

       Aqui comecei a cuidar dos cabelos como cacheado. A moça da loja de cosméticos sugeriu que eu fizesse o registro da minha transição e fotografasse os cabelos por dentro, achei a ideia legal (assim que surgiu a ideia dessa postagem). As fotos foram tiradas em meados de outubro de 2015.

      Ao ver essas fotos tive vontade de cortar mais um pouco. A foto abaixo foi tirada no início de novembro. Tinha acabado de acordar, umidifiquei o cabelo e fotografei. Odiei essa foto, mas é o último registro da parte alisada.

      Me senti tão estranha, que decidi fazer o big chop (como chamam nos vídeos do YouTube o corte que retira todos as partes alisadas). Quando vi a foto, percebi que não fazia mais sentido manter essas partes. A parte de trás estava quase toda natural. Fui dormir, acordei às 6h da manhã do dia 3 de novembro e cortei tudo sem pensar. 
      Ainda estava incrédula com a minha coragem. Foto minutos após cortar, ainda com cara de sono.

      Vale registrar que todos os cortes foram feitos por mim. Uma loucura, não sou cabeleireira! Se eu causasse um dano na parte alisada do cabelo, não seria problema. Queria acabar com ela, seria um motivo a mais para cortar.
       Ainda estou me adaptando, agora é cuidar e deixar ele crescer curtindo cada etapa do crescimento.

Antes, durante e depois:

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